Artigo: “Patamares de desenvolvimento”, por Carlos Alberto Oseko
2 de maio de 2017 |
Boa parte das cidades de Mato Grosso nasceu e se desenvolveu às margens de rodovias federais. A BR-163, em especial, abriga pequenas grandes potências do agronegócio brasileiro: municípios que se tornaram grandes exportadores de grãos tirando da terra – e da estrada – tudo o que elas podiam oferecer.
Quando digo “tudo”, é tudo mesmo. Mas se da terra sempre há o que tirar mais em razão da tecnologia e da habilidade de nossos produtores, da estrada… bem, essa já se exauriu há algum tempo.
Hoje o Brasil perde mais de R$ 3,9 bilhões ao ano devido à inadequação e à má qualidade das estradas destinadas ao escoamento de grãos. A discussão não é nova: há mais de 30 anos o Brasil já deveria estar baseando o escoamento de sua safra em outros modais de transporte, reduzindo a dependência e a ineficiência rodoviária.
Continuar produzindo nesse cenário beira o heroísmo. Dentre os maiores municípios exportadores, Campo Novo do Parecis já demonstra em números crescentes o enorme potencial de desenvolvimento sustentável e vocação de polo regional de destaque internacional.
O mesmo se dá com municípios como Lucas do Rio Verde e Sapezal, que estão em trechos “bons” para escoamento de grãos no Brasil, segundo a CNT. Mato Grosso é responsável por mais de 31% de grãos exportados, sendo um terço do volume de soja e mais de 55% do volume de milho brasileiro.
Não temos mais como “segurar” toda essa safra. Mas eis que surge uma luz no fim da estrada: diante da cooperação entre Brasil, Peru e República Popular da China, para a efetivação da Ferrovia Transcontinental (também conhecida como Bio/Transoceânica), parte do Plano Integrado de Logística (PIL) do governo federal, estaremos mais próximos de parceiros comerciais da Ásia, Europa, Oceano Atlântico e Oriente Médio, além de não trafegar pelo canal do Panamá, onde os EUA, nosso principal concorrente na produção de grãos, possuem grande influência administrativa.
Outros países, como a Arábia Saudita, têm interesse de participar na construção da primeira Ferrovia Transcontinental do Brasil, em trecho de maior viabilidade econômica, com capacidade de transporte de mais de 15 milhões de toneladas de grãos ao ano.
É mais do que uma simples ferrovia: é um corredor de alta capacidade de escoamento de produtos do agro e minerais, indutor de desenvolvimento regional, potencializador de arranjos produtivos no Brasil e em municípios de Mato Grosso como Lucas do Rio Verde, Sapezal e Campo Novo do Parecis, com sua vocação de polo regional logístico.
Tal como as BRs nos anos 1970, a Ferrovia Transcontinental tem potencial de nos levar a um novo patamar de desenvolvimento. Mas é preciso estar preparado para isso. Precisamos planejar um amplo conjunto de diretrizes, estratégias e medidas para ordenar as transformações das cidades.
Exige-se uma visão sistêmica que reconheça os vínculos estratégicos entre as ações estruturantes e as políticas de qualificação da escala local e cotidiana da vida nas cidades que receberão a linha férrea. Se há mobilidade, há desenvolvimento!
Diante mudanças e renovações sócio-políticas no Brasil, em Mato Grosso, além de visão, há motivação e competência dos novos gestores Valcir Casagrande (Sapezal), Rafael Machado (Campo Novo) e Luiz Binotti (Lucas do Rio Verde).
Nessas cidades, o Plano Diretor Estratégico tem que reconhecer o papel do município no contexto regional, identificando um território estratégico para a articulação e estruturação das dinâmicas regionais ao longo das margens de nossos principais rios, rodovias e do futuro traçado-sul da Ferrovia Transcontinental.
É fundamental o planejamento e a criação de ambientes atrativos de incentivo, indução de processos produtivos modernos de emprego e renda sustentável, ao lado da necessária ferramenta de destravar, desburocratizar e discernir o que conservar e preservar, haja vista os desafios ambientais e culturais indígenas.
Desde a macro eficiência, eficácia e efetividade de relações internacionais, harmonia das esferas de governo, diálogo dos poderes e equilíbrio de interesses junto da conexão entre política urbana e o fortalecimento da economia, estímulo à modernização e a expansão de atividades compatíveis com as novas condições territoriais e produtivas dos municípios, favorecerá o desenvolvimento efetivo deste projeto de desenvolvimento.
Esta é a nova visão – este é o nosso desafio.
Carlos Alberto Oseko é arquiteto e urbanista, presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB/MT) e conselheiro titular do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU/MT)