Artigo: VLT x BRT
30 de abril de 2021 |
Sobre a consulta pública, aberta de forma eletrônica no site na Secretaria de Infraestrutura do Governo do Estado de Mato Grosso – SINFRA, para manifestação da população sobre o modal de transporte público na região metropolitana de Cuiabá, envolvendo a conclusão do Veículo Leve sobre Trilhos – VLT ou a mudança para o Bus Rapid Transit – BRT, gostaria de registrar as seguintes considerações:
- Inicialmente, é questionável essa forma de consulta pública e os relatórios apresentados para manifestação da população sobre o modal a ser implantado nas cidades de Cuiabá e Várzea Grande. Como sou formado em administração e em arquitetura e urbanismo, isso facilita melhor leitura e compreensão dos estudos e relatórios altamente técnicos apresentados e, mesmo assim, minha análise foi superficial, sem profundidade necessária que o tema merece. Mas, e o leigo (diga-se, no que se refere ao conhecimento técnico)? Os usuários do transporte coletivo em massa, terão acesso ao portal da SINFRA-MT? Em plena época de epidemia e de alto desemprego, esse público está tendo acesso à internet e pode ficar horas analisando dez relatórios com centenas de folhas? E, em caso afirmativo, terá a compreensão desses relatórios para manifestar a sua opinião? Entendo, pois, que essa consulta pública deveria ser feita por outro canal, mais fácil para o usuário e com dados simplificados, com poucas perguntas e rápida resposta, como por exemplo, os benefícios de cada modal e qual será o valor da tarifa de ambos.
- Percebe-se nos diversos relatórios técnicos, mostrados em seis diferentes cenários para conclusão das obras, os impactos de um e de outro modal, com seus pontos fortes e fracos, mas analiso aqui somente ao relacionado aos custos operacionais. A diferença da necessidade de investimento de recursos entre os Cenário-2 (que defendo, adianto aqui, que trata da retomada o projeto do VLT no escopo original, por meio de Parceira Público Privado – PPP, incluindo a obra e a operação do sistema.), e o Cenário-5 (provavelmente o seja defendido pelo Governo do Estado de Mato Grosso, que é realizar a mudança do modo de transporte para Sistema BRT, com ônibus elétrico, por meio de obra pública, via regime diferenciado de contratação, com a operação posterior a cargo do Governo do Estado do Mato Grosso.), não é tão relevante como divulgado, apesar de ser importante. Da mesma forma, os valores das tarifas apontadas pelo estudo, de um e de outro, apontam que no Cenário-2 é de alguns centavos maior que a do Cenário-5. Pode-se dizer que é questionável…todos os custos envolvidos, de um e de outro modal, foram efetivamente analisados, criticados? E manutenções necessárias? O principal, o usuário do transporte público, aceitaria pagar um pouco mais em troca de um transporte mais confortável, moderno e sustentável?
- Da mesma forma, chama atenção nos estudos, a necessidade de financiamento de obras complementares. Desta feita, para o Cenário-5 (BRT), será bem mais elevado que o Cenário-2 (VLT), onde já foram realizadas 70% das principais obras, que são os viadutos e trincheiras. Além disso, ainda há recursos do financiamento parados na Caixa Econômica Federal – CEF para serem utilizados (algo por volta de R$ 165 milhões). E a própria CEF também já declarou que boa parte das obras do VLT não servirão para o BRT.
- No resultado final, há recomendação da empresa contratada pelos estudos, para a troca de modal, favorável ao BRT. Também entendo que não foi dada tanta ênfase, como deveria, ao risco do Conselho Curador do FGTS, fundo responsável pelo FINANCIAMENTO (que é diferente de empréstimo), órgão ligado a CEF, em não aprovar a alteração do modal para o BRT, senão da conclusão da obra, conforme foi contratada, que é para o VLT. Sem dúvida, caso isso aconteça, o contrato precisa ser melhor analisado juridicamente, pois poderá levar ao vencimento antecipado do financiamento e, provavelmente, os juros serão ser recalculados, passando a ser juros de mercado, e não subsidiados, elevando em muito (estima-se em três a quatro vezes) o saldo devedor do contrato. Mas, como dito, torna-se necessário análise mais profunda do contrato.
- Também não se percebe nos estudos (pode ser passou despercebido), a capacidade de ampliação dos modais, caso necessário, assim como a largura das pistas necessários para rodagem. O BRT é limitado a dois vagões, e são mais largos, ocupando mais espaços laterais. Já os vagões do VLT, são mais estreitos, porém mais longos e cabem vários vagões, possibilitando a sua ampliação nos horários de pico e redução nos demais horários. Isso impacta o custo operacional e, principalmente, a qualidade dos serviços prestados para os cidadãos. Somente quem já andou de VLT saberá dizer e comparar, além de não ser poluente e ser extremamente silencioso.
- E quanto a largura dos viadutos construídos, poderão cruzar simultaneamente dois BRTs? A largura é suficientemente segura? O espaço necessário para os BRT’s fazerem manobras, curvas também é maior. Pensaram nisso, inclusive na necessidade de ampliação das desapropriações?
- Também em contraponto aos relatórios apresentados, através de matérias publicadas no jornal A Gazeta, dos dias 29 e 30 de abril, o especialista e ex-secretário nacional de mobilidade urbana do Ministério do Desenvolvimento Regional, Sr. Jean Carlos Pejo aponta 35 erros cometidos pela equipe técnica que elaborou estes estudos para o Governo do Estado de Mato Grosso. A principal delas é que a tarifa do VLT (R$ 4,40) será mais barata que a do BRT (R$ 4,50), pois não foram considerados nos estudos, o custo da renovação de frotas e baterias do BRT, que representa 40% do seu custo total.
- Finalmente, espera-se também que o Governo do Estado de Mato Grosso não fique olhando somente pelo retrovisor, como fez a gestão anterior. Se houve problemas de corrupção, sonegação, roubos, desvios de recursos, estes devem ser tratados pela justiça, que se espera que os valores envolvidos sejam totalmente recuperados. Entendo que, neste momento, o poder público deve concluir a obra o mais rápido possível, tendo visão futurista, de visionário enxergando 20, 30, 50 anos à frente, como teve o antigo governador Dante Martins de Oliveira, quando construiu os primeiros três parques da capital, ou quando asfaltou a Av. Miguel Sutil (que deveria ter pelo menos mais uma pista de rodagem, mas todo mundo dizia que a obra era faraônica…). Ou, ainda, como a Estação Rodoviária de Cuiabá, que foi pensada 50 anos na frente…até hoje é considerada uma obra atualizada, moderna, necessitando apenas de pequenos ajustes como acessibilidade.
Por tudo isso acredito na continuidade do modal VLT, onde o Governo do Estado de Mato Grosso pode buscar parceria público privada para alavancagem e conclusão das obras, pois o custo-benefício para os usuários do transporte coletivo será muito grande.
Paulo Sérgio de Campos Borges. Administrador, Arquiteto e Urbanista.
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Muito boa a análise sobre o BRT e o VLTT, realmente é muito difícil para um leigo analizar e tomar decisão sobre o assunto.
Muito bom este site!
Fizeram um ótimo trabalho.
Parabéns!!!
Parabéns Paulo pelo mais esclarecedor artigo sobre o assunto que já li.
Excelente artigo! Aborda a atual questão do transporte coletivo público em Cuiabá-Várzea Grande com lucidez e amplitude.
oi. gostei muito do seu site, vou verificar toda semana as atualizações.Obrigado
Caro Paulo Sérgio, meu nome é Fernando Birello, sou Arquiteto também, Professor da nossa UNEMAT e pesquisador de doutorado da USP… aproveitei a sua ordem de raciocínio para tentar tecer algumas colaborações… segue abaixo:
1 – Conselhos públicos de prestação de serviços e regulamentação técnico-profissional, como o nosso CAU, por exemplo, que é dotado, per se, de inadvertida heterogeneidade institucional, portanto de cunho democrático e de Fé Pública, em conjunto com outras instituições insuspeitas, como as universidades e demais institutos de terceiro setor, poderiam fazer essa mediação inteligível ao público leigo em geral, seja na produção de resumos estatísticos e ilustrados desses relatórios, assim como apresentar, mediante consulta preliminar à sua equipe, seja a voluntária, seja a institucional, essa produção avaliativa, por via de vídeos institucionais e meetings colaborativos;
2 – Essa questão imediata do custo da tarifa realmente, ainda que não levianamente, desconsidera a adesão pública potencial à circunstância de custo-benefício do modal em si: aparte dos lobbies das empresas de transporte atuantes no cenário atual dentro do Aglomerado Urbano, a precariedade já pré-existente (incrível que seja assim, mas não surpreendente!) do modal de ônibus oferecido (as lotações e o mal funcionamento dos ares-condicionados) em horários críticos é de revoltante… faço uma presunção de que, pelo menos nos primeiros meses ou nos primeiros anos, dado ineditismo do modal, essa precariedade funcional seja um tanto quanto paliada… e que esse tempo de escape consiga, na adesão popular, a pressão política, e coletiva, necessária ao seu não recrudescimento… e, finalmente, sabemos que, para qualquer imbróglio no custo, o subsídio do estado (e, sendo dentro do aglomerado, estados e municípios seriam perfeitamente rearranjados a respeito) é, e sempre será, a primeira medida necessária.
3 – realmente, ainda que em se sabendo, notadamente, do constrangimento institucional associado à escolha do modal sobre trilhos, inicialmente bem mais custoso do que do modal inicialmente previsto em corredor exclusivo, o custo do retrabalho, reconversão, e requalificação, dada a progressão do andamento da efetivação da infraestrutura (e também que não nos esqueçamos das transformações estruturais na paisagem do Aglomerado), ainda conseguirá ser mais onerosa e desgastante à institucionalidades envolvidas… imagine só: seria ainda muito mais embaraçoso constatar a obsolescência do modal sobre trilhos em se nem mesmo o tendo em funcionamento para tal constatação…
4 – Pois que se faça essa análise profunda do contrato… imediatamente! Aí é que se deve estar os senões das partes envolvidas… seja na agilidade de se retomar e finalizar ou no constrangimento de se assumir a dívida desta obsolescência pré-anunciada do modal… enfim, ao final, se tratam de custos erários, associados aos custos políticos… e quem vai pagar, seja de um jeito ou de outro, é quem sempre pagando o pato… NÓS!
5 – Aí, nessa questão espacial, mais especificamente falando, aproveito para expor minha visão de Arquiteto e Urbanista, e de pesquisador de nossa UNEMAT… tenho acompanhado uma movimentação muito recente, promovida pelo Grupo de Pesquisa e Extensão “Épura”, da UFMT (https://www.youtube.com/channel/UCmEp0YEM3KVQ6UlEB-wAZGQ), com técnicos e leigos, e que, a partir do marco territorial do córrego da Prainha, e de sua significação para com a “cuiabanada”, e com a história de nossa capital, vêm trazendo em uma discussão muito bacana e crescente, além da apresentação de TODOS os estudos e reflexões já realizados desde a formação do IPDU e da implementação do Projeto KURA (e além de estudos do Próprio Épura e do e outros técnicos de nossa categoria), iniciou esse debate na intenção de se propor maiores, mais significativa e profundas transformações nesse eixo do córrego, o qual, não por acaso, também é o eixo de instalação desse novo modal… a profundidade e a radicalidade antevistas até aqui, indicam, ainda que ainda não definam, para uma apropriação dessa faixa territorial restrita ao transporte coletivo, pedonal e cicloviário, o que, em contrapartida, vai poder também trazer a discussão da reocupação e recuperação ambiental (até da destamponagem da Prainha) dessa faixa do córrego… ou seja, menos veículos particulares, mais VLT (ou BRT), bicicletas, natureza e GENTE no centro de Cuiabá… e de ponta a ponta da Prainha, pelo menos.
6 – É como apontei na questão 3.
7 – É como na questão 2.
8 – É como nas questões anteriores, e, reforçando, que talvez você queira saber um pouco mais sobre (e até colaborar) a “Temporada Aberta da Prainha”, que tem sido muito, mas muito gostosa de se debater… daqui pra esses anos todos que você antevê. Bora?
Atenciosamente,
Prof. Me. Fernando Birello de Lima
FAE/UNEMAT – Barra do Bugres
birello@unemat.br
(65) 99958-0947