“Brasileiro é muito caipira para aceitar as inovações que propomos”, diz Bratke
24 de março de 2014 |
Consagrado pela criação de boa parte dos prédios na Berrini, o arquiteto Carlos Bratke lamenta a falta de projetos audaciosos
“O brasileiro é muito caipira. Não aceita os projetos inovadores que propomos, mas fica deslumbrado com o que chega de fora”. A indignação é do arquiteto Carlos Bratke, responsável por mais de 60 dos prédios empresariais construídos na região da avenida Engenheiro Luís Carlos Berrini, considerada um dos grandes centros empresariais de São Paulo. Desde o início dos anos 1970, quando o bairro do Brooklin ainda nem fazia parte do mapa econômico da cidade, o profissional vem imprimindo sua assinatura e ousadia à região, com prédios que abusam de formas e recortes inusitados, vidros espelhados e novos materiais.
São dele, por exemplo, os projetos do Plaza Centenário (carinhosamente apelidado de Robocop) e Bolsa de Imóveis, na marginal do rio Pinheiros. Dos primeiros a terem fachada revestida por placas de alumínio fosco, os edifícios foram alvo de críticas e debates nas décadas de 80 e 90, provando que o novo nem sempre é bem aceito pela clientela. “A inovação, aqui, é vista com muita estranheza”, diz ele, que atribui a isso a falta de ousadia dos arquitetos brasileiros. “Na maioria dos casos isso é culpa dos clientes, que não nos permitem criar”, completa.
Filho do consagrado arquiteto modernista, Oswaldo Bratke – responsável pelo início da urbanização do bairro do Morumbi –, Carlos começou a se envolver com a região da Berrini quando, junto com o irmão Roberto, dono da construtora Bratke Collet, buscava um lugar de fácil acesso e baixo custo para construir prédios comerciais. A resposta surgiu em uma grande área de terrenos alagadiços entre a Hípica Paulista e a Marginal do Pinheiros. Descrente da lucratividade do negócio, Roberto não embarcou de início na aposta e Carlos resolveu buscar a ajuda do pai para dar início à empreitada. As primeiras construções, como a do edifício Urca e o Brasil Interpart, surgiram repletas de influências modernistas dos anos 60, com brises, torres laterais e muito concreto.
Admirador de Frank Gehry e Lino Revi, além dos trabalhos de seu próprio pai, não havia como ser diferente. O brutalismo dos grandes volumes e do concreto aparente extrapolou a região Sul e ganhou corpo com a assinatura de Bratke em outras partes de São Paulo, como na avenida Paulista e no Alto de Pinheiros. “Ele é um dos profissionais mais criativos da minha geração. O modernismo paulista contribuiu em sua carreira no sentido de promover a experimentação. Bratke conseguiu traduzir a ideia em uma arquitetura contemporânea bela e instigante”, afirma Tito Livio Frascino, arquiteto e ex-diretor da EMURB (Empresa de Urbanização de São Paulo).
A região da Berrini ficou marcada pela presença de mais de 60 prédios assinados por Carlos Bratke
Mas as possibilidades do trabalho com concreto não bastavam a Carlos Bratke, que desde muito cedo se viu pensando sobre novas possibilidades de formas e materiais para conseguir resultados arquitetônicos ousados e mais econômicos. Nem mesmo a sua casa no Morumbi escapou das novas experiências. O arquiteto recorreu a uma estrutura tensionada, repleta de cabos de aço, para sustentar o telhado e dispensar a presença de pilares internos. A solução diminuiu o custo da obra e resultou em um prêmio no 43º Salão de Belas Artes de 1979.
Bratke também foi um dos primeiros a experimentar o alumínio em fachadas, alegando conseguir otimizar a vedação das estruturas e ter um material propício à criação de curvas. Mas demorou a aceitar o uso de vidros. “Tinha muita preocupação com a quantidade de luz do sol que poderia entrar e aquecer os ambientes. Além disso, não havia uma tecnologia adequada nos vidros. A realidade hoje mudou e o material está mais barato”, ressalta.
Prova disso é o edifício comercial OPI2, ainda em construção na Rua Sansão Alves dos Santos (próxima à Berrini). O projeto conta com vidros de diferentes tonalidades e traços contemporâneos com curvas e vãos livres. “Carlos Bratke é um profissional muito investigativo que busca sempre a melhor forma nos projetos. Em alguns casos ele inova inclusive na planta do empreendimento”, diz Valter Caldana Junior, diretor do curso de arquitetura e urbanismo do Mackenzie. Tamanha dedicação em projetos espalhados por todo o País (apenas em Cuiabá, foram 27 residências construídas) já foi reconhecida em inúmeros prêmios ao longo de sua carreira, sendo o da Assembléia Legislativa de São Paulo (1979) e o Grande Prêmio III Bienal Internacional de São Paulo (1997), alguns deles.
Talento desde criança
Carlos Bratke nasceu em 1942 e desde cedo já mostrava talento para as artes. O traço forte e preciso de seus desenhos o impulsionou rumo ao ateliê do pai, onde o ajudava nos trabalhos de perspectiva. Mas o futuro na arquitetura ainda era colocado em xeque. O jovem se interessava pelo mundo das artes plásticas, chegando até a cogitar seguir carreira. A falta de segurança financeira da área, no entanto, o fez entrar na faculdade de arquitetura do Mackenzie. Casou-se aos 23 anos com Amélia, antiga colega de cursinho, e teve duas filhas – Bárbara (hoje arquiteta) e Carolina (fotógrafa). Separou algum tempo depois, encontrou Hilda e teve mais um filho. Foi professor em faculdades como Mackenzie, Belas Artes e se destacou na carreira pública. Envolveu-se na diretoria do Museu da Casa Brasileira, na presidência do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) e da Fundação Bienal de São Paulo.
Edu Cesar
Carlos Bratke busca inovar em seus projetos e conseguir novas aplicações aos materiais
Hoje, mesmo aos 72 anos não para. Trabalha o dia inteiro na avenida Berrini (claro), em seu escritório no edifício Oswaldo Bratke – uma discreta construção dos anos 80, de tijolos aparentes e lajes desconexas, planejada por ele. Sua equipe tem apenas sete integrantes e todos os esforços estão concentrados em obras que envolvam o acesso público – igrejas, teatros e escolas, por exemplo. “Não estou mais preocupado em descobrir um novo polo econômico para São Paulo – apesar de achar que a cidade se desenvolverá para além do Morumbi. Agora quero levar minha carreira para onde haja comunhão de pessoas”, afirma Carlos que até o final do ano publicará um livro sobre a sua trajetória na arquitetura.
Os projetos mais recentes, ainda em andamento, são o Centro Cultural da Fundação Oscar Americano, o teatro do Shopping Villa Lobos e o teatro de ópera de Campinas (SP). A aposta para este último é o uso de placas pré-moldadas de concreto. “A solução é antiga, mas agora consigo moldar a placa da maneira como imagino. Acredito que a arquitetura do futuro será feita de revestimentos semelhantes a uma casca, valorizando ideias práticas e simples”, afirma.
Fonte: Mídia News
Comunicação CAU/MT